I. Introdução
Se eu perguntar a alguém: “porque não devo queimar seu braço com ferro em brasa?”, o que me responderia essa pessoa? Diria ela: “por que eu sou inteligente”? Ou diria “porque eu tenho grande habilidade de comunicação”? Ou ainda “porque existe um acordo tácito entre nós para que não causemos dano um ao outro”? Investigar essa pergunta talvez seja uma forma simples de resumir os argumentos em favor dos Direitos Animais.
Muitos vegetarianos têm a convicção de que animais têm direitos e que o respeito a esses direitos comanda que nos abstenhamos de comê-los. Entretanto, essa convicção muitas vezes não é acompanhada da reflexão filosófica necessária para respaldá-la. Isso é um problema, pois o raciocínio lógico e a força do argumento racional são fundamentais para difundir os Direitos Animais e convencer a maioria dos interlocutores. Por isso é importante que os ativistas da causa animal tenham clareza na hora de abordar essa questão fundadora: por que animais têm direitos?
Ao tratarmos dela, é fundamental que, em primeiro lugar, não a tomemos como senso comum. Todo diálogo sobre veganismo e Direitos Animais deve começar com ela. As bases do pensamento que advogamos, como defensores dos Direitos Animais, infelizmente, nem sempre estão claras mesmo para os que os defendem, que dirá para os demais. Mesmo ativistas dedicados têm dificuldade de entender essas questões – o que é um problema grave, pois a falta de conhecimento pode levar à incoerência nas ações e à confusão no discurso, reduzindo significativamente a força e a eficácia do ativismo pelos animais. Para defender nossos princípios, o primeiro passo é buscar compreender aquilo que fundamenta nossas escolhas éticas.
Para começarmos a falar de por que animais têm direitos, sugiro começarmos pelo caminho contrário: os pensamentos por trás daqueles que defendem que animais não têm direitos.
II. Por que Animais Não Têm Direitos?
Nessa discussão, vejo duas linhas de raciocínio básicas: uma do direito, outra da biologia. Então vejamos cada uma delas.
1. A objeção do direito
Existem duas vertentes do direito que são relevantes para o debate da questão dos Direitos Animais: o direito moral e o direito legal. Os que defendem que animais não têm direitos, em geral, rejeitam tal atribuição de direitos em função de uma visão de direitos baseada em direitos legais.
Essa visão que nega direitos aos animais não-humanos é baseada numa leitura contratualista conservadora, que afirma que só têm direitos aqueles indivíduos que também têm deveres. Os direitos e deveres são firmados por meio de um contrato – logo, só tem direitos quem for capaz de firmar contratos. Direito, nessa concepção, é um benefício que o indivíduo obtém em troca de um compromisso, pelo qual ele está obrigado a oferecer, em troca, algum outro benefício, através do qual se garante, assim, o convívio harmonioso e pacífico e, em última instância, a sobrevivência e prosperidade de toda a sociedade. Essa teoria contratualista do direito está toda fundada na filosofia de Thomas Hobbes e sua obra O Leviatã, de 1652.
Aparentemente muito lógica, essa filosofia hobbesiana tem dois problemas muito básicos. O primeiro deles, de ordem ética e moral, é que, longe de garantir direitos, ela exclui grande parte dos indivíduos humanos da comunidade de direitos. O contratualismo hobbesiano condiciona a ética à política – ou seja, a lei determina o que é ético e o que não é – mesmo no caso em que uma lei pareça injusta.
Entre indivíduos que não podem assinar contratos e não podem, portanto, contrair obrigações, podemos incluir: recém-nascidos, crianças, comatosos, pessoas com certos tipos de enfermidade e problemas de ordem neurológica ou cognitiva. Subscrever o contratualismo hobbesiano é, portanto, um convite à barbárie – e isso já fora descoberto há muito tempo, e por outros contratualistas: John Locke, no Segundo Tratado sobre o Governo, de 1690, afirmava que o estado de natureza (a ausência de governo) era melhor que o Estado absolutista defendido por Hobbes. Jean-Jacques Rousseau, no Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens, de 1755, deixa claro que a capacidade de firmar contratos não encerra a questão dos direitos morais, incorporando, inclusive, os animais às suas considerações. Vale a pena citarmos um trecho em particular:
Dessa maneira, não se é obrigado a fazer do homem um filósofo, em lugar de fazer dele um homem; seus deveres para com outrem não lhe são ditados unicamente pelas tardias lições da sabedoria; e, enquanto não resistir ao impulso interior da comiseração, jamais fará mal a outro homem, nem mesmo a nenhum ser sensível, exceto no caso legítimo em que, achando-se a conservação interessada, é obrigado a dar preferência a si mesmo. Por esse meio, terminam também as antigas disputas sobre a participação dos animais na lei natural; porque é claro que, desprovidos de luz e de liberdade , não podem reconhecer essa lei; mas, unidos de algum modo à nossa natureza pela sensibilidade de que são dotados, julgar-se-á que devem também participar do direito natural e que o homem está obrigado, para com eles, a certa espécie de deveres. Parece, com efeito, que, se sou obrigado a não fazer nenhum mal a meu semelhante, é menos porque ele é um ser racional do que porque é um ser sensível (…). (ROUSSEAU, J.-J. Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens. São Paulo: Martin Claret, 2005, pp. 28-9; grifos meus).
Thomas Paine, filósofo e revolucionário, em Direitos do Homem, de 1792, declarou que o contrato social não dava aos contratantes o direito de escravizar, dominar ou fazer guerra contra pessoas fora do contrato.
O segundo problema do contratualismo hobbesiano, de ordem prática, decorre do primeiro. Felizmente, na maioria das sociedades, e para a maioria dos indivíduos humanos, não é mais esse tipo de contratualismo que orienta o direito legal. Este avançou, na maioria dos países – ao menos nominalmente – para um contratualismo rousseauniano, que reconhece direitos morais a todos os seres humanos que sejam portadores da nacionalidade de um determinado país. Todos os indivíduos descritos no parágrafo acima contam, hoje, com garantias para preservar seus interesses básicos à vida, liberdade e integridade física assegurados na Constituição de seus países – estes não estão mais atrelados ao exercício pleno e consciente da cidadania. Eles não são sujeitos de direito apenas porque temos deveres indiretos para com eles (porque matá-los causaria sofrimento aos seus familiares, por exemplo), como sugerem os contratualistas conservadores. Eles têm seus direitos reconhecidos por serem indivíduos da espécie humana.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas, subscrita pela grande maioria dos Estados, não faz distinção de nenhum tipo entre seres humanos, e afirma textualmente que os Direitos Humanos são universais, imprescritíveis, intransferíveis. Os estrangeiros, no entanto, especialmente imigrantes, nem sempre têm seus Direitos Humanos garantidos por lei, como podemos constatar pelos debates dentro da União Européia. Isso se deve a questões políticas e ao alcance das leis nacionais, que por definição excluem os estrangeiros, e não a falhas intrínsecas na teoria dos Direitos Humanos. Mas também nesse terreno tem havido avanços significativos na construção de um direito cosmopolita, que não reconhece barreiras nacionais, como se vê pela prisão do ditador chileno Augusto Pinochet, na Grã-Bretanha, a pedido de um juiz espanhol, em 1998, sob acusação de violações dos Direitos Humanos durante a ditadura militar que comandou no Chile. Pode-se ainda argumentar que, na prática, todos os países desrespeitam sistematicamente os Direitos Humanos – o que é verdade. No entanto, esses direitos são reconhecidos, o que em si já é uma conquista, e é um diferencial fundamental, pois fornece instrumentos legais para lutar contra violações dos direitos fundamentais praticados nesses países.
Essa discussão está longe de ser esgotada. Afinal, nossa sociedade ainda funciona sob um marco jurídico em que nem sempre a ética e política coincidem, de modo que, num embate entre ambos, sempre irá prevalecer aquilo que é legalmente justo, mesmo que seja eticamente condenável. Apenas quando o direito legal e o direito moral coincidirem plenamente os Direitos Humanos – e os Direitos Animais – serão efetivamente respeitados, preservados e promovidos.
De qualquer modo, podemos concluir que, mesmo dentre os contratualistas, a abordagem conservadora e autoritária de Hobbes está, há muito, ultrapassada. Que ainda haja quem subscreva suas teses é um sinal de ignorância ou de hipocrisia. Mesmo a visão jurídica predominante nos dias de hoje admite que nem todo direito é um benefício obtido em troca de uma obrigação. Alguns direitos – os direitos fundamentais – são direitos inerentes, ou seja, garantias que devem ser respeitadas, independente de obrigações anteriores ou posteriores, única e exclusivamente em função das característas próprias – inerentes – do portador desses direitos. Animais não-humanos não têm esse reconhecimento legal de seus direitos morais devido à tradição e ao especismo, e não em função de algum atributo básico que lhes falta para serem considerados membros da comunidade moral. A característica básica que faz com que todos os seres humanos sejam portadores de direito, os animais não-humanos também possuem – a sensibilidade descrita por Rousseau, que nós hoje chamamos de senciência, a qual vamos abordar detalhadamente mais adiante.
2. A objeção da biologia
A objeção da biologia, como veremos, logo se confunde com a objeção do direito. Seu patrono é o filósofo René Descartes (1596-1650), e se funda basicamente em dois argumentos: animais são seres autômatos, desprovidos de sensações e sentimentos; e animais são desprovidos de razão e linguagem que lhes possibilite elaborar conceitos e exprimir desejos. Como só seres humanos são portadores dessas características, apenas eles são portadores de direitos, pois apenas para eles a vida, a liberdade e a integridade física e psíquica são um bem precioso. Animais não têm interesse particular em continuar vivendo, nem em serem protegidos do sofrimento físico (pois suas respostas a estímulos externos são mecânicas, e o sofrimento envolve uma elaboração mental que exige uma racionalidade que lhes falta), nem em serem livres (pois não têm um “conceito” de liberdade).
As objeções de ordem biológica também têm dois problemas primordiais. Em primeiro lugar, a tese cartesiana é falsa porque sua própria premissa é falsa. A linguagem não é pré-requisito para ser consciente. Fosse assim, seres humanos já nasceriam falando, ou jamais aprenderiam a falar, não nascendo com esta faculdade. Afinal, é preciso, primeiro, ter consciência de um objeto para, depois, dar-lhe um nome.
Nós protegemos seres humanos que não são dotados de pleno domínio da razão e da linguagem – que são conhecidos como “seres humanos não-paradigmáticos” – recém-nascidos, cujos pensamentos e desejos nos são um completo mistério; crianças, que não têm suas faculdades de raciocínio e linguagem plenamente desenvolvidas, razão pela qual, aliás, elas não podem votar; pessoas em coma ou portadoras de problemas neurológicos ou cognitivos, temporários ou permanentes, que comprometam sua racionalidade e/ou capacidade de comunicação. Há algum outro fator, fundamental, que faça com que estes seres humanos sejam reconhecidos como sujeitos de direitos e respeitados como tal. Assim como Hobbes para o direito, se a tese de Descartes fosse ainda tida como valida, pela biologia, estes seres humanos seriam vistos apenas como objetos e estariam vulneráveis a todo tipo de abuso.
Em segundo lugar, a tese cartesiana é falsa porque suas conclusões sobre os animais não-humanos também é falsa. Hoje em dia, nenhuma pessoa com algum conhecimento ou experiência pode, seriamente, alegar que animais são autômatos desprovidos da capacidade de sentir dor. Aqui também, as críticas não tardaram muito a aparecer. O filósofo iluminista François-Marie Voltaire (1694-1778), já no século XVIII, ridicularizou a tese cartesiana. Disse ele: “Responda-me, mecanicista: organizou a natureza todas as fontes do sentimento nesse animal com o propósito de que ele nada possa sentir? Tem ele nervos a fim de que se torne incapaz de sofrer?” O nosso conhecimento atual sobre os animais evoluiu tanto que sequer podemos seriamente discordar que eles são dotados de raciocínio, de linguagem – muitas delas extremamente complexas, como no caso de baleias e elefantes –, de sentimentos, e que eles têm desejos e, portanto, interesse em ser livres – do contrário eles não buscariam conscientemente evitar situações dolorosas e não perseguiriam situações que foram fonte de prazer no passado.
Por que então, se não por pura hipocrisia, exigir-se-ia dos animais, para serem portadores de direitos fundamentais, critérios e pré-requisitos que não são exigidos dos seres humanos? Trata-se de uma diferença de tratamento sem fundamento e, portanto, irracional – eles, que gostam tanto de apresentar-se como guardiães da razão –, baseada unicamente no preconceito. Preconceito contra as espécies diferentes da nossa, que, conforme definido por Richard Ryder, hoje conhecemos como especismo.
Vejamos, então, porque a questão deve ser abordada de outro modo: responder, por que, afinal, animais têm direitos.
III. Por que Animais Têm Direitos?
Qual é, então, o critério lógico e racional para atribuir direitos fundamentais a um indivíduo? Por que sua vida, sua liberdade e sua integridade devem ser respeitadas? Na verdade, a pista para a resposta já foi dada anteriormente, logo no primeiro parágrafo desse texto.
Retomando-o: se eu perguntar a alguém: “por que não devo queimar seu braço com ferro em brasa?”, ela não me responderia “porque eu sou inteligente”, ou “porque eu tenho grande habilidade de comunicação”, ou ainda “porque existe um acordo tácito entre nós para que não causemos dano um ao outro”. Nem racionalmente, nem instintivamente, essas respostas poderiam ser consideradas corretas. A inteligência ou a habilidade de comunicação não são características relevantes para avaliar o dano que uma queimadura é capaz de provocar num ser humano. Afinal, a queimadura não irá afetar nenhuma dessas duas características. Tampouco a resposta contratualista é satisfatória. Ela responde muito mais o “como” do que o “porquê”. Ela não diz o que há de errado na ação acima descrita, nem o motivo pelo qual é um erro queimar o braço de alguém, muito menos explica porque seres humanos fora do contrato também são protegidos contra esse tipo de agressão. O contrato é, tão somente, o meio que encontramos (dentro dessa teoria) para nos proteger de tal situação. Portanto, o contratualismo não dá conta da complexidade nem das raízes materiais dos nossos valores morais.
A resposta correta para a pergunta acima é: “porque irá me causar dor e danos físicos, o que por sua vez irá me causar sofrimento e comprometer a qualidade da minha vida”. Claro está, portanto, que a inteligência, a fala ou a capacidade de firmar contratos não podem ser usadas como parâmetro para avaliar eticamente ações que comprometam a vida de outros seres, sejam eles quais forem – além das limitações, vistas acima, na capacidade dessas respostas darem conta do respeito que prezamos por todos os seres humanos, tanto em nossos valores quanto em nossas leis.
Em resumo, o dano que causamos ao tirar a vida ou comprometer a integridade de outro ser não é conseqüência da sua capacidade intelectual. Devemos proteger aqueles seres que, por sua vulnerabilidade, são dotados da capacidade de sofrer – um sofrimento que é físico e psíquico. Em outras palavras, têm direitos fundamentais aqueles indivíduos que são seres sencientes – seres que têm uma consciência individual, ainda que em diferentes graus de complexidade, pois são capazes de perceber ameaças diretas às suas vidas; e também dotados de sensações individuais de prazer.
Senciência é um mecanismo de defesa típico do mundo animal, que serve como um alerta para situações potencialmente nocivas à vida do indivíduo. Ao desencadear-se o mecanismo da dor, o indivíduo protege-se, afasta-se da fonte da dor, para preservar sua vida. Este ato é muitas vezes instintivo – mesmo num ser humano. Ao retirar a mão do fogo, por exemplo, o ser humano reage antes de seu cérebro interpretar o estímulo racionalmente. Se nos fosse necessário compreender o que é fogo antes de nos protegermos dele, estaríamos arriscando nossa vida. Por outro lado, tampouco nos animais não-humanos a resposta ao perigo é meramente instintiva. A capacidade de interpretar é fundamental. Pensemos em gazelas, búfalos, zebras e outros animais que são presas de animais carnívoros: eles precisam interpretar os sinais da aproximação do predador – cheiros, sons, imagens – antes de estarem diante dos mesmos, caso contrário estariam em séria desvantagem; da mesma forma os predadores precisam interpretar cheiros, sons, imagens para localizar as presas e aproximarem-se sem ser notados. Se pensarmos nas plantas, entenderemos que elas não são dotadas de senciência. Seria inútil, para um ser que vive fixado à terra, sentir dor. Os animais, por outro lado, são sencientes justamente porque sua capacidade de locomover-se faz com que precisem de mecanismos para buscar e obter seus meios de sobreviência, e fugir das ameaças à sua vida. A decorrência lógica do conceito de senciência é, portanto, que todo ser senciente tem interesse na vida, na liberdade e na integridade física e psíquica – mesmo que não consiga elaborar esses conceitos racionalmente.
Além disso, a vida, a liberdade e a integridade física e psíquica não são apenas atributos a que o animal tem interesse, mas são atributos do interesse do animal, ou seja, mesmo que ele não se dê conta disso, a perda de cada um deles acarreta-lhes um dano irreparável. Para os seres sencientes, a morte é um dano irreparável, pois significa a aniquilação de sua consciência e a cessação de todas as sensações e experiências que lhe produzem bem-estar. A perda da liberdade é um dano irreparável porque a liberdade é condição para viver de forma autônoma – logo, condição para preservar a própria vida. Sem liberdade, o ser senciente está vulnerável, pois está limitado na sua capacidade de buscar sua sobrevivência e proteger-se daquilo ameaça sua vida. Torna-se dependente de outros indivíduos para manter-se vivo e incapaz de buscar o que lhe proporciona bem-estar. A violação da integridade física ou psíquica é um dano irreparável porque representa, além do risco de perder a vida, um sofrimento inestimável.
Sem liberdade e sem integridade física e psíquica, a vida do ser senciente, se não estiver encerrada, será uma vida limitada e, portanto, fonte de sofrimento. De que adianta a um ser senciente viver enjaulado, incapaz de expressar livremente sua natureza e perseguir seus interesses? Pergunte isso a ser humano e você entenderá – o mesmo acontece com os animais não-humanos; prisioneiros, escravos reduzidos a propriedades dos seres humanos, eles não podem ser eles mesmos, portanto têm uma vida pela metade. Não é, portanto, sem razão o ditado que afirma que, sem liberdade, a vida é uma dádiva inútil.
IV. Conclusão
Estes são, portanto, os direitos que preconizamos para os animais não-humanos, pois são os que decorrem de sua natureza senciente – natureza a qual eles partilham conosco, seres humanos. Os direitos fundamentais que queremos estender para todos os animais foram aqueles consagrados como os Direitos Humanos de primeira geração – os direitos à vida, à liberdade e à integridade física e psíquica. Nós defendemos que esses direitos não são exclusivamente humanos. São Direitos Animais. Os Direitos Animais são assim chamados porque são direitos morais que são relevantes não apenas para seres humanos, mas para todos os animais. Isso porque são direitos que se referem a interesses básicos, resultantes da própria manifestação da natureza do indivíduo – pois, em condições ideais, todos os seres sencientes nascem livres e só sobrevivem se estiverem física e psiquicamente íntegros. Ao ser humano, devido à complexidade de sua interação com seus semelhantes, pode-se e deve-se reconhecer outros direitos fundamentais, que são essenciais para um ser humano, mas absolutamente desnecessários aos demais animais, pois estão fora da esfera da relação humano-animal, sendo restritos às relações entre humanos. Tais direitos fundamentais, embora muitos deles ainda não sejam reconhecidos como tais pelo discurso dominante, incluem, com pouca margem para controvérsia, o direito à educação, à saúde e à participação política. Aqui sim, podemos falar estritamente em “Direitos Humanos”. Os três direitos basilares, porém, sem os quais todos os demais não significam absolutamente nada – a vida, a liberdade e a integridade – são direitos que os humanos partilham com todos os demais animais, donde sua definição mais apropriada é, como foi dito, “Direitos Animais”.
Esses direitos geram deveres negativos – afinal, se resultam de atributos naturais do indivíduo, não devemos interferir nos bens que são do interesse do indivíduo em decorrência dessa natureza (daí também o conceito, hoje um tanto obsoleto, de direito natural). Mas geram também deveres positivos – esses direitos devem ser protegidos e promovidos pela sociedade, e reparados se uma vez violados. No que se refere aos animais não-humanos, isso implica evitar todo dano que possa ser infligido contra eles e reparar todo dano que possa ter sido feito. Uma vez que seus direitos morais já são, infelizmente, sistematicamente violados, para garantir esses direitos, precisamos, acima de tudo, deixar de fazer uma série de coisas: deixar de usá-los como objetos e propriedade, deixar de explorá-los, deixar de criá-los artificialmente, deixar de caçá-los, deixar de usarmos os subprodutos da sua exploração. Mas também temos deveres positivos: lutar por mudanças; despertar consciências; promover o respeito aos animais não-humanos, enquanto indivíduos (e não apenas como membros de uma espécie); preservar o meio ambiente em que eles vivem; reparar, na medida do possível, os danos que lhes causamos em função da exploração deles e da natureza. E a premissa básica no mundo de hoje para promover o respeito aos Direitos Animais, o primeiro e principal passo para efetivamente respeitar e promover os direitos dos animais não-humanos, é: sermos VEGANOS.